quinta-feira, 11 de outubro de 2007

O guardião da Sé

Chave da sacristia é guardada com cuidado por Gilvan, que não abre mão da segurança dos objetos sacros da igreja Foto: Júlio Jacobina/DP

Há 60 anos, Gilvan Pereira da Silva se dedica a cuidar da igreja-mãe da Arquidiocese de Olinda e Recife

JAILSON DA PAZDA EQUIPE DO DIARIO

De tantos anos que trabalha na Catedral da Sé, seu Gilvan é confundido com a história da igreja-mãe da Arquidiocese de Olinda e Recife. As brincadeiras são comuns no entra-e-sai diário de fiéis e turistas. "Aqui não é apenas o templo que é tombado pelo patrimônio histórico, o sacristão também é", costuma dizer Graça Queiroz, guia de turismo. A menos de três metros, ele sorri timidamente. E a resposta vem rápida: "fui tombado para a eternidade". Mal termina de falar e os olhos correm para o outro canto. "Esse é seu Gilvan", diz outro guia, para um grupo de estrangeiros que caminha em direção à porta central do templo. O tratamento sempre é este. Poucos sabem o seu nome completo: Gilvan Pereira da Silva.

Depois de 60 anos como sacristão, completados em setembro, ele nem dá ouvidos aos pronomes de tratamento. Prefere, como afirma o dito popular, estar com um olho no padre e outro na missa: acompanhar a movimentação dos visitantes. "Afinal, sou eu o guardião desta catedral", justifica. De fato. Aos 71 anos, está à frente dos serviços do templo-mor da arquidiocese. Varre o chão, troca os arranjos de flores quando preciso.

"Teve uma senhora que passou a mão no banco com medo de sujar a roupa. Eu disse: pode sentar, senhora. Aqui tudo é limpo", orgulha-se. De tão limpos, os 63 bancos brilham. O chão, do mesmo jeito. Mas a coluna e os braços, admite, não suportam fazer tal esforço. Mesmo assim, ele monitora de perto a qualidade.

Os fiéis e os turistas, ele nem sempre consegue controlar. Tem gente que entra falando alto, arrastando a sandália, de roupas curtas. "O respeito não é mais o de antigamente. Esqueceram que aqui é a casa de Deus", lamenta. Os outros esqueceram. Seu Gilvan, não. E faz questão de mostrar-se indignado. Um dos alvos são os bonés e chapéus. "Menino, aqui é a casa de Deus", fala para um adolescente, que fica surpreso com a firmeza do guardião. "Pois não, senhor", respondeu. "É o boné! Quando a gente está diante do altar, a cabeça fica descoberta", ensina.

Rapidamente, o adolescente descobre a cabeça, olha para a imagem de Cristo crucificado. Meio encabulado, é verdade, porém em silêncio. O rol de lições é extenso. "Nessa casa, de São Salvador do Mundo, ninguém entra em trajes de banho. É da porta para fora", sentencia.Da "porta para dentro", seu Gilvan exige, sem abrir precedentes, que siga-se à risca as regras da igreja. Afinal, já aposentado poderia estar em casa. Ficar ao lado da mulher, dos filhos. Acordar a qualquer hora do dia. Mas optou em seguir cuidando do templo.

"Fui falar com dom José Cardoso quando me aposentei. Ele perguntou se eu queria ficar, eu quis", afirma. E continuou na mesma rotina de limpeza do santuário e de serviços à arquidiocese. Ao arcebispo, de modo especial. Em muitas missas presididas por dom José está seu Gilvan lá. Tudo por causa dos objetos usados nas celebrações, como cálices, bacias, âmbulas, cruz episcopal.

http://www.pernambuco.com/diario/2007/10/11/urbana5_0.asp

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