segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Comportamento: Quando Olinda vira Paris

No Carnaval, turistas do planeta inteiro invadem a cidade patrimônio. Gente (de longe) que escolheu a cidade para viver conta a aventura de morar num cartão-postal


Todos os anos, 29 milhões de pessoas do mundo inteiro invadem Paris. Justificável, então, o mau humor dos 2,2
Foto: Divulgação DP/D.A Press
milhões (dados de 2007 do Consulado da França) de moradores que estão na cidade intramuros. Ir a boulangerie (padaria) vira uma aventura. Jardins e igrejas também ficam lotadas. Cansada de tanto tumulto, a artista plástica francesa Marianne Peretti decidiu viver na terra de seu pai. Pernambuco. Ou melhor, em Olinda. "Me apaixonei desde o primeiro passeio, aos 19 anos", recorda. Igual a ela, muitos estrangeiros se encantam pelo bucolismo das ladeiras. Até que chega o carnaval e Olinda vira Paris. No pior sentido. O que acham esses apaixonados moradores da invasão à sua casa?

Marianne Peretti viveu tranquilamente com a confusão de foliões durante 20 longos anos. Mora no Varadouro, porta de entrada do município, desde 1987. Há dois anos, decidiu dar uma voltinha para ver de perto a animação e não conseguiu escolher o caminho a seguir. Foi fagocitada por uma imensa célula de suor e cerveja. "A partirdali, decidi que Olinda, para mim, é o ano inteiro. Menos no carnaval. Aliás, ela não foi feita para a festa. Passo os quatro dias trancada em casa", reclama.

Se um dia ocupasse um cargo na prefeitura, uma de suas primeiras providências seria dar o devido charme que Olinda exige. "Deixaria mais espaço na Sé para a vista. Hoje, esse ponto está tomado por barracas. Gostaria que tivéssemos aqui um festival parecido com o de Dubrovnik, Croácia, à beira do Mar Adriático", sugere a escultora. Ela não permitiria que as pedras que asfaltam todo o sítio histórico fossem deformadas por pneus de carro durante os festejos. "Amo tanto o lugar que escolhi para morar que sinto de verdade quando o vejo assim, maltratado", declara Marianne.

Outro fã ardoroso, o americano Michael Loveman, volta a Olinda todos os anos. "Nunca no carnaval. Não gosto nem um pouco do vuco-vuco", fala, em tom irritado e português castiço. Terça passada, Michael retornou a Cleveland, em Ohio, Estados Unidos, para rever a família depois de quase três meses vivendo como um legítimo olindense. "Quando estou aqui, gosto de passear no Alto da Sé, no fim da tarde, e visitar locais que mostram novidades na música, como o Quintal do Rossi", indica Michael, que pesquisa a sonoridade regional. Ele até criou o Shalom Brasil, um grupo de ritmos pernambucanos e melodias judaicas.

Ao contrário dos dois, o alemão (quem diria!) Peter Bauer não compara Olinda com nada que esteja sobre a face da Terra. "O carnaval de Colônia nem chega perto do que vejo na Rua do Amparo, onde moro. É muita animação, felicidade transbordando. Como poderia interferir nesse tipo de expressão tão particular?", questiona Peter com seu vocabulário também particular, cheio de erres. Para ele, a casa onde mora, com vista para o Recife e pé de fruta-pão no quintal foi o melhor presente que poderia ganhar de aposentadoria.

Até 1999, Peter foi funcionário da Prefeitura de Stuttgart. Mas a história com Olinda começou antes. "Em 1987, fiz minha primeira viagem. Sempre ouvi falar do Mosteiro de São Bento, do clima tropical. Na Alemanha, Recife é menos conhecida que sua vizinha. Por isso, foi paixão à primeira vista". Em 1991, na sua sexta volta, parou diante da placa de vende-se. "Comprei na hora e montei minha pousada, do Peter", completa. A partir desta semana, ela vira uma espécie de embaixada, onde os hóspedes falam alemão à vontade. Uma beleza. Irritação só aparece quando uma marca de cerveja ou plano de saúde veste um boneco gigante ou outra atração típica. "Absurdo, tentativa de padronizar as imagens do carnaval", agita-se o politizado Peter.


http://www.diariodepernambuco.com.br/2009/02/17/diariorevista2_0.asp

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